O HISTORIADOR MORRETENSE - ERIC J. HUNZICKER

segunda-feira, 5 de dezembro de 2016

FERNANDO AMARO DE MIRANDA
Novembro, mês de finados, também o foi do simples e modesto poeta Fernando Amaro de Miranda, criatura digna e respeitável, que deixou o rol dos vivos num dia triste, como triste foi sua alma.
Retratá-lo, não é muito fácil.
Entretanto, o morretense José Gonçalves de Moraes de tradicional família, em um artigo publicado em 1887, disse, com bastante eficiência:
“Conheci, pessoalmente, Fernando Amaro. Eu tinha, quando ele morreu, mais ou menos seis anos de idade; mas lembro-me perfeitamente do seu todo, porque ele frequentava assiduamente a nossa casa. Era alto, elegante; tinha a tez rosada e usava toda a barba, que era negra. Um moço bonito de figura e de maneiras simpáticas. Gostava muito de conversar, rir, brincar e dançar com moças. Sabia preparar uma “soirée” prestando-se com muito gosto para arranjar a sala, fazer convites e distribuir o chá. Foi ele quem enfeitou a sala de nossa casa para o baile oferecido ao Dr. Zacarias de Góis e Vasconcelos, quando este cidadão veio inaugurar a nossa Província. Apesar do Presidente ter passado por Antonina, o baile realizou-se, a instâncias de Fernando Amaro, em Morretes”.
“O dia de sua morte foi de imenso pesar para a população da então Vila de Morretes. Ele era, ali, extremamente benquisto e estimado. Ninguém acreditava em tão triste acontecimento. Morreu em casa de um seu íntimo amigo, Vicente Loyola. Muitos anos depois, achou-se, nessa casa, em um caixote aberto, entre papéis velhos e sem valor, três manuscritos seus; sendo dois cadernos de versos e um caderno contendo um começo de drama. Tive os três cadernos em meu poder, durante muito tempo e hoje estão na Biblioteca Pública de Curitiba, para onde os mandei no fim da administração “Taunay” (Presidente Dr. Alfredo d’Escragnole Taunay), juntamente com alguns livros”.
“Fernando Amaro publicou muitas de suas produções, prosa e verso, em um pequeno jornal que havia em Santos”.
Em outro artigo, também publicado, escreveu o Sr. J. Moraes:
“Acho que há engano na data da morte de Fernando Amaro, porquanto, no dia 15 de novembro de 1857, o Juiz Municipal respectivo expediu uma portaria ao escrivão, Santos Souza, mandando-o intimar a Vicente Ferreira de Loyola para prestar juramento de inventariante dos bens desse finado, e, a Antonio Gonçalves do Nascimento e José Antonio de Medeiros para depositários dos mesmos bens”.
“A ter, Fernando Amaro, falecido nesse dia, é preciso confessar que houve demasiado zelo e pressa em se tomar essas providências”.
“Sou de opinião que ele faleceu no dia 14 de novembro de 1857
e sepultado no dia 15; o que é confirmado pelas datas das contas de despesas para o seu funeral, que têm, 15 de novembro de 1857, e não podiam nem deviam ser prestadas no mesmo dia do falecimento”. 

“Entre os seus bens arrecadados, incluindo as mercadorias do seu negócio, figuram: “Um Parnaso Lusitano”, uma “Mitologia”, uma arte poética, um livro dos amores, duas revistas mensais (Acayaba), um livro de ciências, cinco livros escritos contendo obras do mesmo”. “O lote composto de um volume de poesias (Pulsações de minha alma) e de um drama em 4 atos e um quadro, Triunfo dos Agredidos, foi avaliado por 20$000 e arrematado em praça pública por Rs 51$000 por Antonio Luiz Gomes, velho rábula que aqui havia, conhecido pela alcunha de Manêta. O bilhete de depósito na Coletoria desta Vila, da quantia de Rs 51$000, importância do lote arrematado, diz assim: O Sr. Antonio Luiz Gomes depositou nesta Coletoria a quantia de Rs 51$000, proveniente de gêneros que arrematou, pertencentes ao espólio de Fernando Amaro de Miranda”. “Seu espólio montou em Rs 2.254$480 (dois contos duzentos e cinquenta e quatro mil e quatrocentos e oitenta réis).

O poeta fumava charutos e tinha bonita letra. Era negociante a varejo, no Largo da Parada e tinha casa de comissões. Parece, entretanto, que nunca fez coisa alguma, porque, em vez de cuidar do seu balcão, e de agradar a freguesia, cuidava mais de conviver com as “musas” e de agradar as moças bonitas... porque era apaixonado por bailes. Era também secretário da Câmara Municipal de Morretes. Gostava de passar bem e vestia-se corretamente à moda do tempo”.
“A última vez que o vi, poucos dias antes de sua morte, vestia com elegância, calça, colete e fraque de linho branco, e calçava sapatos de verniz, muito novos. Nessa ocasião, tratava de arranjar uma “soirée” para essa noite e pedia a meu pai que lhe cedesse a casa para tal fim. A “soirée” realizou-se e, durante ela, Fernando Amaro esteve alegre, expansivo como costumava e dançou muito. Antes disso, tratando de obter doces para o chá, ele fez rir aos que o ouviam, dizendo com graça: doces para as moças e bolachas para os homens.”
“Insisto nestas particularidades e minúcias, apenas para provar que Fernando Amaro, em vez de ter o espírito taciturno e frio, como talvez alguém julgue, era galhofeiro, espirituoso e pândego, como hoje se diz”.
Nestor Vitor, escrevendo uma vez, cm 1887, qualquer coisa sobre o poeta paranaense, disse:
“Sobre Fernando Amaro, as informações que tenho são bem poucas, quase todas extraídas dos seus versos”. “Sei que ele era paranaense, que foi guarda livros, que aqui esteve, e esteve em Morretes, em Curitiba, e que morreu moço ainda”. Além disso, não ignoro que ele teve amizade íntima com um José Vitorino da Silva Azevedo, de quem eu possuo um volume de versos chatos, volume já um tanto dilacerado. “Este José Vitorino foi, em seus tempos, muito acatado aqui pela Província, onde casou-se, segundo se infere de uma poesia a ele oferecida pelo nosso Miranda. “Era português, segundo consta-me, tinha seu verniz artístico, e foi de certo devido a ele que o Fernando pôde ler o Castilho, o Soares dos Passos, o Bulhão Pato e outros que de vez em quando cita. “É, pouco mais ou menos, o que sei; mas é fácil o caminho para chegar-se adiante. “Ele ofereceu versos ao José Pinheiro, ao Comendador Alves de Araújo (a este muitos) e a outras pessoas que já não vivem: mas destes que ainda podem falar, poder-se-ia colher larga notícia e, quiçá, o seu retrato”.
O poeta, em seus versos, queixa-se constantemente de não ter tido estudos, nem convívio que lhe fosse útil, dizendo que escreve “por gosto” e não para “passar por vate”.
Eis aí o que pudemos colher, através de novas pesquisas, sobre o primeiro poeta paranaense, que nasceu a 24 de junho de 1831 e deixou este mundo no ano de 1857, aos 14 de novembro. na vizinha cidade de Morretes, com apenas 26 anos de idade, levando
para o túmulo o seu incompreendido amor (segundo várias crônicas, com muitas controvérsias).
Morreu, FERNANDO AMARO DE MIRANDA, como quase todos os poetas, moço, deixando aos pósteros os seus tristes e sentidos versos cheios de tanta mágoa. Nas suas poesias, ele sempre extravasou o que lhe ia na alma insatisfeita, contrariamente à vida que levava na sociedade morretense em que se criou (através da fonte fidedigna do velho e honrado Sr. J. Moraes).

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